a broa

Com quantos grãos um pão se fez?
Dez mil talvez?
Dez mil almas, dez mil calvarios e agonias
Todos os dias.
Eil-o em cima da mesa do teu lar.
Olha a mesa: um altar.
(A Oração do Pão, Guerra Junqueiro, 1902)

– Amanhãm por’a meia pode tchigar a buscar que tem-la já desfora do forno!
Dizia-me ontem a Dona Francisca à porta de casa, com o carrego da labadeira cheia da roupa à ilharga, acabada de lavar no tanque.
Aquele pão amarelo, de grossa e estaladiça côdea, quase do tamanho da roda de um carro, cozido no forno ainda com cheiros a pinheiro e mimosa, já se queda ajeitado longe do alcance dos ratos, nas prateleiras da camboeira, suspensa do tecto a um dos lados da casa do forno. Pelo ar ainda adeja o cheiro brando e doce da cozedura, envolto num espalhado véu esbranquiçado a adornar ancestrais rituais de feitura…
S. Vicente te acrescente,
S. Mamede te levede e
S. João de ti faça pão
Ámen.
Cresça o pão no forno,

Ele a crescer
E nós a comer
Reze quem puder e souber.
Hoje fui-me à broa!

6 comentários sobre “a broa

  1. Olinda Melo 10 Janeiro, 2024 / 20:48

    Olá, Jorge Esteves

    Sou de uma terra onde o milho entra em tudo. Lembro-me de uma espécie
    de broa que se fazia no borralho.
    O milho era amarelinho o que lhe dava uma cor convidativa.
    O seu texto e a reza são deliciosos, quase como a tradição dessa broa de côdea
    estaladiça.
    Um Bom Ano, meu amigo.
    Um abraço
    Olinda

  2. jorgesteves 7 Janeiro, 2024 / 17:31

    Bartolomeu Fernandes,
    Pois é!, também eu não via enquanto andava pela cidade! Queres o que queres, que não é muito compatível com broa amarelinha a sair do forno…
    Mas como és boa praça, sabes que é só dizeres que vens!
    Um bom ano para ti também!
    Abraço.

    Natália Machado,
    A broa amarela é de milho; o milho quer muita água… e isso é o que mais há por aqui!
    É fumo derramado na casa do forno de vizinhos próximos. Pelo meio, envergonhado, o sol ensaia algumas pinceladas de luz.
    Um bom e farto ano, Natália.
    Abraço.

    Maria Amélia,
    E broa de milho, sim, que o há por essas bandas! Sempre houve bom e farto milho.
    Não que eu seja trabalhador da matéria, mas esse bocado de massa, oriundo da fornada anterior, sempre passa de forno a forno, ou melhor dito, de masseira em masseira, já que tem a função de servir de fermento. Sabia?
    Abraço.

    Beatriz Caldeira,
    Trás-os-Montes é mais agreste, pouco mimoso com o milho, daí não ser usual haver.
    Compensa noutros sabores…
    Abraço.

    A todos bem-hajam.
    Abraços

  3. Beatriz Caldeira 4 Janeiro, 2024 / 22:51

    Por estes lados de Vila Real a broa é de mistura não se vê só de milho porque ele é todo para forragem e é apanhado com máquinas. Mas lembro-me dela.
    Gosto de ler as suas recordações

  4. Maria Amélia 3 Janeiro, 2024 / 22:13

    Olá meu caro Jorge.
    Em Melgaço os pais da minha mãe com oitenta anos ainda coziam a broa duas vezes por mês. Era engraçado porque lhe misturavam um bocado da massa da broa da vizinha. E bem saborosa era a broa.
    Beijo

  5. Natália Machado 1 Janeiro, 2024 / 14:56

    Pão amarelo, como? Se é milho nunca vi broa de milho amarelo. Por aqui em Abrantes a broa é de mistura.
    É uma fotografia do cimo do monte?
    Bom ano amigo Jorge.
    Abraço.

  6. Bartolomeu Fernandes 1 Janeiro, 2024 / 01:22

    Es um sortudo, mano! Aos tempos que não vejo uma assim amarelinha e quente.
    Bom ano, amigão!